Às margens do rio Guamá, em Belém, o Estado do Pará está colocando em prática um novo modelo de desenvolvimento econômico para a Amazônia: um Parque de Bioeconomia e Inovação, criado para apoiar empreendedores na transformação de produtos florestais, como açaí e castanha-do-pará, em mercadorias voltadas para os mercados nacional e internacional.
Inaugurado no mês passado, o complexo foi inspirado em modelos de inovação como o Vale do Silício e tem como objetivo modernizar a economia local preservando a floresta em pé. A iniciativa busca criar empregos, fomentar novos negócios e promover a bioeconomia como alternativa às atividades extrativistas de alto impacto ambiental, como a pecuária e a mineração.
“Queremos que o Estado do Pará faça da floresta uma vocação estratégica, transformando nossa biodiversidade em uma nova economia que gere empregos e oportunidades”, afirmou o governador Helder Barbalho (MDB). “Precisamos reduzir a dependência de economias emissoras de gases de efeito estufa e investir em modelos de baixo impacto, que valorizem a floresta viva.”
Experiências práticas de sucesso
O chef paraense Leonardo Souza é um dos primeiros empreendedores a se beneficiar do BioPark. Antes limitado a produzir 60 potes de sal artesanal por dia em fornos alugados, Souza agora alcança a marca de 1.000 unidades diárias, ampliando a rede de fornecedores de 42 para cerca de 200 famílias. Seu negócio, iniciado durante a pandemia de Covid-19, exemplifica como a bioeconomia pode gerar renda local e transformar comunidades.
O Brasil lançou, no ano passado, um plano nacional para tornar a bioeconomia uma força significativa da economia, abrangendo desde pequenos negócios até produção de medicamentos fitoterápicos, concessão de florestas nativas e turismo sustentável. O programa Eco Invest busca atrair capital privado estrangeiro para projetos sustentáveis, combinando US$1 bilhão em recursos públicos do Fundo Climático do Brasil e do Banco Interamericano de Desenvolvimento para alavancar US$3 bilhões em investimentos privados.
“O capital catalítico adicional de 20% permitirá viabilizar projetos complexos ou de maior risco, oferecendo treinamento e assistência técnica aos pequenos produtores”, explicou Rogério Ceron, secretário do Tesouro do Ministério da Fazenda. A iniciativa abrange setores como artesanato, pesca e agricultura sustentáveis, além de extração de matérias-primas para cosméticos.
Bioeconomia competitiva
Um estudo de 2019, realizado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), pela Nature Conservancy e pela Natura, mostrou que 30 cadeias de produtos florestais no Pará geraram R$4,24 bilhões em renda local — praticamente o mesmo valor gerado pela pecuária, principal atividade ligada ao desmatamento. “Este é um mercado que vai além de nichos. Pode se tornar muito forte”, destacou Paula Caballero, diretora da Nature Conservancy para a América Latina.
Entre os produtos mais emblemáticos está o açaí, cuja popularidade mundial impulsionou o mercado de US$1,23 bilhão em 2024 para projeções de US$3,09 bilhões em 2032. No Ver-o-Peso, centenas de barcos desembarcam a fruta diariamente para abastecer mercados no Brasil e no exterior.
O empresário francês Damien Binois é um dos que comercializa açaí diretamente de produtores locais. Desde 2012, exporta para França, Espanha, Irlanda e Bélgica, envolvendo 150 produtores, sendo 50 deles assistidos diretamente pela sua empresa NOSSA! AÇAÍ. Uma fábrica em Barcarena, a 100 km de Belém, deve ampliar a produção e gerar até 200 empregos até 2030. “O açaí tem se tornado uma oportunidade real de melhoria da renda das pessoas”, afirma Binois.
Café e reflorestamento
Além do açaí, o café orgânico é outro destaque da bioeconomia amazônica. No sul da Amazônia, no chamado arco do desmatamento, cooperativas cultivam café premium sob sombra de árvores nativas, combinando produção agrícola com reflorestamento. Sarah Sampaio, da ONG Amazônia Florestal, auxilia 234 famílias oferecendo preparo do solo, mudas e assistência técnica, garantindo a compra do produto e prêmios adicionais por sua qualidade e sustentabilidade. Os cafés são vendidos no Brasil e exportados para Holanda e França.
Desafios e oportunidades
Apesar do potencial, desafios ainda existem. Segundo Carlos Nobre, especialista em bioeconomia, produtos da biodiversidade representam apenas 0,4% do PIB brasileiro, enquanto a pecuária corresponde a 6%. “Cooperativas de bioeconomia protegem a floresta, empregam mais e geram renda superior à soja e à pecuária, mas ainda têm participação pequena no PIB regional”, explica.
Cooperativas locais demonstram que é possível aliar preservação ambiental e desenvolvimento econômico. A maioria dos produtores já alcançou a classe média, com lucros três a sete vezes maiores que os setores convencionais e capacidade de empregar 10 a 20 vezes mais pessoas.
Tradição e inovação
O Ver-o-Peso, em Belém, simboliza a integração entre tradição e inovação. Bete Cheirosinha, 72 anos, quinta geração de vendedoras de ervas, mantém o conhecimento indígena e caboclo para produzir remédios naturais. Já Allison Charles combina tradição e tecnologia, vendendo farinhas e produtos amazônicos pela internet, conectando consumidores a memórias e sabores da região.
A experiência paraense mostra que a bioeconomia pode transformar a Amazônia em um polo de desenvolvimento sustentável, preservando a floresta e gerando prosperidade para suas comunidades.
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