O governador do Pará, Helder Barbalho, já avisou: quer tomar uma tigela de açaí com o presidente Donald Trump durante a COP30, marcada para novembro em Belém. Mas, fora dos pavilhões da conferência, o cenário é outro: o açaí anda caro, ralo e, para muitos paraenses, quase impossível de comprar.
Considerado o “arroz com feijão” da Amazônia, o açaí é mais que um alimento: é sustento de milhares e símbolo da cultura paraense. Só que nos quatro primeiros meses deste ano, o preço do litro do tipo grosso – o mais apreciado – subiu 56%, saltando de R$ 35,67 para R$ 52,10, segundo o Dieese-Pará. Em relação a abril de 2023, a alta acumulada chega a 27,6%.
A justificativa da entressafra não explica tudo. A estiagem severa, agravada pelo El Niño e pelas mudanças climáticas, tem afetado drasticamente a produção. O fruto está menor, menos saboroso e a safra, mais curta. “Tem safra que nem começa. As árvores estão morrendo”, relata Marcos da Silva, produtor quilombola de Acará.
A situação é tão crítica que batedores tradicionais, como Paulo Tenório, fecharam as portas. Sem condições de manter o negócio, ele virou motorista de aplicativo. “Estou em abstinência de açaí”, diz, sem conseguir sequer consumir o que antes vendia.
Enquanto isso, o açaí conquista o mundo – dos cafés da Califórnia aos shoppings de Dubai – e impulsiona a exportação no Pará, que bateu 61 mil toneladas em 2023. Mas esse sucesso global tem um preço: muitos pequenos produtores estão priorizando fábricas que congelam a fruta para vender fora do estado, em vez de abastecer o mercado local.
Belém tem enfrentado a falta de açaí fresco e, cada vez mais, o consumidor recorre à chamada “churamba” – a água escorrida do caroço – para misturar ao pouco que consegue comprar. O resultado é um alimento menos nutritivo, ralo e caro.
Além do clima, a produção artesanal sofre com a ausência de infraestrutura e de políticas públicas. A tentativa de permitir que pequenos batedores congelem o açaí – criando estoques reguladores – foi barrada por veto do governador. A proposta, aprovada pela Assembleia Legislativa, previa flexibilizar regras sanitárias para ajudar o setor a enfrentar os tempos de escassez. Mas o governo alegou inconstitucionalidade e riscos à saúde.
Enquanto isso, as grandes indústrias seguem ampliando o domínio sobre o produto. E os pequenos produtores e comerciantes temem perder espaço até mesmo no mercado interno.
“Estão tirando o açaí da nossa mesa”, resume Paulo Tenório. Para ele, a Amazônia que alimenta o mundo pode acabar deixando sua própria gente com fome.
Com informações BBC News
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