SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – O Corinthians entrou no Maracanã com uma dívida bilionária, um presidente impichado e o rótulo de clube em colapso institucional. No entanto, o Timão se consagrou como a equipe paulista com o melhor desempenho esportivo nesta temporada, após conquistar o tetracampeonato da Copa do Brasil sobre o Vasco.
O UOL reuniu os bastidores de como o clube conseguiu isolar o futebol de um cenário que misturou investigações policiais e o caos político para voltar a ser campeão nacional após oito anos.
ANO MARCADO POR PÁGINAS POLICIAIS
A investigação sobre o contrato da Vai de Bet transformou o Parque São Jorge em cenário de busca e apreensão por meses. O que deveria ser o maior patrocínio da história do futebol brasileiro tornou-se um caso de polícia, com suspeitas de lavagem de dinheiro e repasses para empresas de fachada vinculadas a laranjas.
O envolvimento de ex-dirigentes e membros da cúpula atual em depoimentos à Polícia Civil desgastou a imagem do clube. As autoridades vasculharam computadores e documentos em busca de provas sobre a participação de intermediários fantasmas na negociação do patrocínio máster.
Por fim, a Justiça aceitou a denúncia que transformou o ex-presidente Augusto Melo e outros antigos diretores em réus no processo criminal. O avanço das investigações apontou indícios de crimes de associação criminosa e lavagem de dinheiro relacionados ao contrato. Com o status de réus, os antigos mandatários agora respondem formalmente pelas irregularidades que precipitaram a queda da gestão.
TÍTULO PAULISTA SOBRE O PALMEIRAS
A vitória sobre o Palmeiras na final do Paulistão 2025 foi o primeiro grande sinal de que nem tudo estava perdido. Mesmo com a crise externa, dentro de campo o elenco permanecia unido sob as ideias do executivo de futebol Fabinho Soldado.
O atacante Memphis Depay protagonizou o lance mais emblemático daquela decisão ao subir na bola para irritar os adversários – e deu certo. A atitude do holandês incendiou a torcida e se tornou símbolo da conquista.
Porém, os sinais de problemas seguiam. Isso porque a premiação individual paga ao atacante pelo título estadual foi basicamente o valor total do prêmio entregue pela Federação Paulista ao clube campeão. Graças ao gatilho contratual, Memphis embolsou R$ 4,7 milhões – de uma premiação de R$ 5 mi – evidenciando o modelo financeiro insustentável praticado pela gestão.
PROCESSO DE IMPEACHMENT E CRISE POLÍTICA
O processo de impeachment avançou nas comissões de ética com base em denúncias de gestão temerária, que abrangiam desde o caso Vai de Bet até o departamento financeiro quebrado. A pressão política não foi apenas de opositores, mas também de aliados que abandonaram a “base governista” de Melo após as revelações sobre as cláusulas ocultas no contrato de patrocínio.
O clima de incerteza contaminou os funcionários e gerou um ambiente de desconfiança no CT. No mesmo período, o ex-presidente tentou se segurar no cargo com diversas liminares judiciais – e até uma invasão com aliados ao Parque São Jorge para tirar Osmar Stabile, interino até então, da cadeira da presidência.
Em maio, a votação do impeachment, momento de maior baixa institucional do clube em décadas, sacramentou a saída de Augusto.
‘FECHADO POR MÁ ADMINISTRAÇÃO’
A sede social do Parque São Jorge viveu cenas de “guerra” com a invasão de torcedores organizados, em 3 de junho. O episódio marcou o ápice da tensão popular, com manifestantes furando o bloqueio de segurança para cobrar explicações diretas à diretoria.
Os torcedores exigiam mudanças estruturais consideradas inegociáveis. A pauta incluía o direito a voto para o Fiel Torcedor, a reforma profunda do Estatuto do Clube e a punição rigorosa aos dirigentes responsáveis pelas dívidas bilionárias deixadas em gestões passadas.
Stabile recebeu membros da torcida para tentar conter a crise interna após a deposição da diretoria anterior. No encontro, o mandatário prometeu acompanhar de perto as questões relativas às categorias de base, mas alertou que a reforma estatutária seria um processo complexo que envolveria ritos no Conselho e na Assembleia Geral – o que mais tarde se provou ser verdade.
EM BAIXA NO BRASILEIRÃO E NA AMÉRICA
A irregularidade nas demais competições do ano foi a grande marca de um elenco que oscilava entre o brilho das copas e a apatia nos pontos corridos. No Campeonato Brasileiro, o Corinthians conviveu com o fantasma do rebaixamento durante grande parte da competição.
Nas competições continentais, o desempenho foi marcado por frustrações e eliminações que expuseram a curta profundidade do elenco. Tanto na pré-Libertadores quanto na Sul-Americana, o clube não conseguiu sustentar o ritmo, sucumbindo diante de adversários inferiores, como Barcelona-EQU e Huracán-ARG.
Inclusive, a campanha irregular nas outras frentes aumentou o peso de obrigação sobre a Copa do Brasil para salvar o balanço esportivo do ano.
COMPROMETIMENTO E MOBILIZAÇÃO DO GYM
O trio GYM (Garro, Yuri e Memphis) ignorou dores agudas e lesões musculares recentes para se colocar à disposição da comissão técnica na reta final da Copa do Brasil. Tanto meia quanto o camisa 9, que vinham de uma maratona de jogos exaustiva, passaram por controle de carga.
Memphis Depay liderou o esforço nos bastidores ao cumprir cronogramas de recuperação em três turnos no CT Joaquim Grava. O atacante holandês, mesmo com a necessidade de infiltrações, esteve à disposição de Dorival Júnior.
A entrega física dos três principais jogadores do elenco serviu como o combustível moral necessário para o restante do time – e teve impacto direto no desempenho.
Dos 90 gols do Corinthians em 2025, 17 foram feitos em tramas diretas entre, pelo menos, dois dos três protagonistas, inclusive o gol do título da Copa do Brasil, marcado por Memphis Depay com assistência de Yuri Alberto. No total, 18% dos gols corintianos na temporada tiveram envolvimento direto do trio GYM na construção (bola na rede + passe).
No total, foram:
Oito gols de Yuri com passe de Memphis;
Quatro gols de Yuri com passe de Garro;
Dois gols de Garro com passe de Memphis;
Dois gols de Memphis com passe de Yuri;
Um gol de Memphis com passe de Garro.
O DEDO DO TREINADOR
Mesmo com o título paulista conquistado em fevereiro, Ramón Díaz foi demitido do comando técnico corintiano. Em seu lugar, foi contratado Dorival Júnior, que tinha sido demitido da seleção brasileira pouco antes.
Embora tenha passado por algumas turbulências, e até mesmo balançado por conta das campanhas irregulares nas competições internacionais e no Brasileirão, o treinador deu ao Timão a identidade copeira que ele mesmo possui.
A estreia do treinador pelo Corinthians foi justamente na primeira partida do clube pela Copa do Brasil, a vitória por 1 a 0 sobre o Novorizontino, pela terceira fase da competição.
Dorival, que não é eliminado do torneio nacional desde 2016, quando comandava o Santos, venceu a competição pela quarta vez na carreira – igualando Felipão como técnico com mais títulos – sendo o terceiro nos últimos quatro anos.
Cheguei ao Corinthians em abril e fiz uma visita à minha família de dois dias uma vez em Florianópolis e nunca mais fui para lá. A entrega foi toda para algo positivo acontecer. E não foi por acaso. Uma equipe que vence todas as partidas fora de casa, faz uma campanha como fizemos, merece respeito, reconhecimento e consideração – Dorival, após conquistar a Copa do Brasil pelo CorinthiansNA FRENTE DO RIVAL
A conquista do título coloca o Corinthians como o dono do melhor desempenho esportivo de São Paulo. Mesmo com uma dívida bilionária e sem a capacidade de investimento do rival alviverde, o Timão provou que a hierarquia do futebol não depende apenas de cifras.
O Palmeiras promoveu uma reformulação multimilionária em seu elenco, mas terminou o ano sem título. A comparação é gritante: enquanto o vizinho exibia saúde contábil e reforços caros, o Corinthians jogava pela sobrevivência institucional e transfer ban.
O título serviu para atestar a resiliência de um grupo de jogadores que ignorou o caos extra-campo.
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Fonte: Notícias ao Minuto







