Como é uma cowgirl? Para alguns, a pergunta pode evocar imagens de camisas xadrez, chapéus Stetson e calças jeans. Mas na escaramuza, o esporte equestre exclusivamente feminino importado pelo EUA do México, a resposta é um pouco diferente.
Antes de cada competição de escaramuza, as equipes se alinham para ter seus uniformes medidos. Diretrizes rigorosas determinam que os vestidos vitorianos em camadas, frequentemente de cores vibrantes e enfeitados com renda, devem ser longos o suficiente para cobrir a garupa dos cavalos. Brilhos e miçangas são proibidos, mas todos os acessórios, dos brincos aos broches, devem combinar.
As botas também precisam ser idênticas em toda a equipe. Sob cada vestido há uma camada de anágua e uma bloomers — ambas devem estar perfeitamente passadas. A falta de uma única camada pode desclassificar toda a equipe.
Depois de aprovadas na inspeção, essas mulheres espetacularmente vestidas executam uma elaborada rotina sincronizada montando lateralmente. Seus vestidos esvoaçantes transformam-se em rajadas de rosa, roxo e azul-celeste enquanto galopam pela arena.
A fotógrafa Constance Jaeggi passou quase dois anos viajando pelos EUA, passando pela Califórnia, Texas, Idaho, Colorado, Oregon e Washington D.C., fotografando essas mulheres, inicialmente para uma exposição no Museu Nacional da Cowgirl e Hall da Fama em Fort Worth, Texas, e posteriormente para o livro “Escaramuza: The Poetics of Home”.
Esse contraste visual — o cavalo forte e musculoso trabalhando sob camadas de delicadas anáguas — é adorado pela moda. A ex-estilista da Dior, Maria Grazia Chiuri, inspirou-se no traje tradicional da escaramuza, como visto no desfile Cruise 2019 da marca; enquanto a edição de setembro de 2025 da Vogue apresentou as autodeclaradas admiradoras de cavalos Kendal Jenner e Gigi Hadid montadas em magníficos corcéis usando vestidos rendados McQueen.
Jaeggi espera que as pessoas sejam atraídas por seus vibrantes retratos de mulheres lindamente vestidas e permaneçam para uma história mais profunda e complexa sobre feminismo, imigração e sacrifício pessoal.
“Acredito que o aspecto da moda seja o ponto de entrada mais fácil”, disse Jaeggi em entrevista por vídeo.
Além de fotografá-las, Jaeggi acompanhava horas de ensaios das equipes e frequentemente jantava com suas fotografadas em suas casas.
Ela entrevistou as mulheres e compartilhou as conversas gravadas com as escritoras méxico-americanas Ire’ne Lara Silva, a Poeta Laureada do Texas em 2023, e Angelina Sáenz, que escreveram 15 poemas cada, tanto em espanhol quanto em inglês.
O resultado é uma história de duas faces — as águas calmas e previsíveis das imagens de Jaeggi, em contraste com a tempestade tensa que se forma nas palavras das poetas.
“Quando comecei a pesquisar e conversar com as escaramuzas, percebi como as histórias orais eram importantes para a narrativa delas”, disse ela. Jaeggi também estava “muito consciente” do fato de que ela própria não é méxico-americana. “Não tenho essa conexão cultural e pessoal, e senti que era importante garantir que isso fosse uma parte significativa do trabalho.”
Em vez de visitar o país de origem do esporte, Jaeggi se interessou pelas mulheres que trabalhavam arduamente para estabelecer a escaramuza nos EUA.
“No México, é realmente um esporte dos ricos”, disse ela. Mas as performers que ela conheceu, a maioria imigrantes de primeira ou segunda geração, contavam uma história diferente.
Das vendas de bolos para financiar o custo dos extravagantes vestidos feitos à mão para competições (as vestimentas custam aproximadamente $300 a $400 — entre R$ 1.584 e R$ 2.112 — cada e são importadas através da fronteira mexicana) até ajudar com gasolina nos carros umas das outras, as equipes que Jaeggi conheceu eram comunidades financeiramente interdependentes com um objetivo comum: aperfeiçoar sua arte atlética.
“Uma das histórias que eu ouvia repetidamente era que levou anos, algumas gerações, para conseguirem ter condições de ter cavalos e praticar esse esporte”, disse ela. “Isso tornou tudo ainda mais impressionante para mim, o fato de que elas dedicam tantos recursos a isso.” Quando as discussões chegavam ao tema da imigração, “havia certa hesitação” das mulheres em se manifestar publicamente, disse Jaeggi, porque eram indocumentadas.
Isso foi em 2023 — antes da missão de deportação em massa do Presidente Trump e da mobilização do ICE. “É um clima político difícil atualmente”, ela acrescentou.
Ao longo do livro de Jaeggi, há uma corrente subjacente de desigualdade que regularmente vem à tona. A escaramuza é uma apresentação de cinco a dez minutos dentro das três horas tradicionais da charrería — a competição exclusivamente masculina de rodeio e equitação que também é o esporte nacional do México.
A charrería foi declarada esporte nacional do México em 1933, embora as mulheres só tenham sido autorizadas a se apresentar como um show de intervalo em 1953. A escaramuza só foi reconhecida como evento competitivo atlético em 1992.
Mesmo hoje, os uniformes dos competidores masculinos não são inspecionados tão rigorosamente quanto os de suas contrapartes femininas, observa Jaeggi, algo que ela atribui ironicamente a “dinâmicas interessantes de gênero”.
Enquanto as mulheres estão empenhadas em manter suas tradições e cultura, elas se sentem oprimidas pelas visões essencialistas e rígidas do esporte sobre gênero. É um vai e vem complexo que se manifesta principalmente na escrita.
“Mulheres/São cidadãs de segunda classe neste esporte”, diz um verso do poema de Sáenz, “Você fica mais bonita quando está calada”. Em outra obra, “Machetona”, Silva interpreta a luta de uma companheira de equipe lésbica que tenta se rebelar contra a misoginia inerente à escaramuza.
A história da montaria lateral, por exemplo, vem do medo de que montar com as pernas abertas pudesse romper o hímen da mulher, comprometendo a evidência de sua virgindade e, consequentemente, seu valor.
“Quando se tratava de questões sobre gênero e feminismo, e de pressionar contra algumas dessas fronteiras de gênero, acho que a maioria das mulheres estava realmente disposta a falar sobre isso”, disse Jaeggi. “Elas sentiam que suas vozes nem sempre eram ouvidas em sua comunidade, e então havia muita frustração sendo expressa. Foram conversas realmente importantes”.
Em “The Poetics of Home”, orgulho e frustração se misturam em partes iguais. Mas todas concordam que uma comunidade imperfeita é melhor do que nenhuma.
A “irmandade”, como a escaramuza é frequentemente chamada no livro, proporciona a essas mulheres propósito, direção e um sentimento de pertencimento. “Uma irmandade/Nascida da luta, dos sonhos e do treinamento”, diz o poema “Lo Nuestro” de Silva.
E por mais que este esporte esteja enraizado na herança cultural, as mulheres que competem hoje têm seus olhos voltados para o futuro. Jaeggi recorda uma conversa com uma cavaleira de escaramuza, que lhe disse que “uma das principais razões pelas quais ela pratica este esporte é que ela quer que as meninas, a próxima geração, vejam que, como mulher, você também pode montar a cavalo.”
“Por muito tempo dentro da charrería elas não podiam”, disse ela. “A ideia de ter uma mulher competindo ao lado de um homem, ou cavalgando ao lado de um homem em um cavalo, era impensável.”
Com Informações: CNN Brasil







