Por que amazonenses ainda hostilizam paraenses, apesar das origens comuns na Amazônia?

O vídeo ofensivo publicado por um jornalista manauara, que chamou os paraenses de “feios, pobres e fedidos”, chama a atenção para um debate antigo: por que há tantos episódios de xenofobia de amazonenses contra paraenses, mesmo compartilhando raízes históricas, culturais e territoriais?

As declarações de Breendo Teixeira, feitas durante uma visita a Belém, causaram revolta nas redes sociais. Além de menosprezar a capital paraense, ele ironizou o povo paraense em tom depreciativo. A repercussão gerou uma onda de críticas que forçou o jornalista a publicar um pedido de desculpas. O caso, no entanto, expõe feridas abertas entre os dois maiores estados da Amazônia brasileira.

Uma origem comum: o mesmo tronco amazônico

Pará e Amazonas já foram um só território. Até 1755, a Capitania de São José do Rio Negro (atual Amazonas) era subordinada ao Grão-Pará. Mesmo após o desmembramento, a dependência administrativa persistiu por décadas.

A separação formal aconteceu somente em 1850, mas um episódio marcante ajuda a entender o ressentimento histórico: durante o processo de Independência do Brasil, em 1822, o governo do Pará reteve a convocação para que o Amazonas participasse da Assembleia Constituinte, impedindo a região de enviar representantes e atrasando sua autonomia política. A independência só foi conhecida no Amazonas um ano depois, por causa da retenção da informação em Belém.

Caminhos distintos de desenvolvimento

Durante a Ditadura Militar, os dois estados tomaram rumos econômicos muito diferentes. O Amazonas recebeu da União a Zona Franca de Manaus (ZFM) — um modelo de industrialização artificial e concentrado na capital — que transformou a cidade em um polo de consumo e oportunidades, mas gerou um fenômeno conhecido como macrocefalia urbana, onde a maior parte da população e da infraestrutura se concentra em Manaus, em detrimento das outras regiões.

Já o Pará seguiu um modelo agromineral de ocupação, com grandes projetos de mineração, infraestrutura e geração de energia. Isso provocou a formação de novas cidades, atraiu migrantes e estimulou o desmatamento, mas resultou em uma rede urbana mais complexa e diversificada. Cidades como Marabá, Santarém, Parauapebas, Altamira e Castanhal têm protagonismo regional que contrasta com a centralização amazonense em Manaus.

Migração e tensões sociais

A ZFM atraiu milhares de trabalhadores — em especial do oeste do Pará, como moradores de Santarém, Itaituba e Alenquer — que se deslocaram para Manaus em busca de emprego. Com o tempo, a presença paraense em áreas periféricas da capital amazonense passou a ser alvo de preconceito e estigmatização, alimentando uma visão xenofóbica disfarçada de “rivalidade regional”.

Esse cenário reforçou estereótipos negativos e tensões entre migrantes paraenses e manauaras, especialmente em contextos de disputa por espaço urbano, mercado de trabalho e identidade cultural.

Disputa pela liderança amazônica

Nos últimos anos, o protagonismo crescente do Pará em pautas ambientais, especialmente com a escolha de Belém para sediar a COP30, ampliou a visibilidade do estado no cenário internacional. Esse avanço reacendeu sentimentos de rivalidade, já que o Amazonas tradicionalmente se apresentava como “o coração da Amazônia” por abrigar a maior floresta contínua e Manaus como vitrine da região.

Com a agenda climática global girando agora em torno de Belém, cresceu também a disputa por quem representa de fato a Amazônia brasileira — tanto em termos de biodiversidade quanto de identidade cultural.

Cultura compartilhada, disputa de narrativas

Apesar da rivalidade, Pará e Amazonas compartilham sotaques semelhantes, pratos típicos parecidos (tacacá, açaí, peixe com farinha), heranças indígenas, ribeirinhas e afro-amazônicas. Parintins, no Amazonas, é o maior espetáculo cultural do estado, enquanto Belém preserva tradições como o Círio de Nazaré, um dos maiores eventos religiosos do Brasil.

Ambos os estados são fundamentais para a formação da identidade amazônida, mas muitas vezes disputam entre si o direito de representá-la — o que também acirra rivalidades políticas, culturais e até afetivas nas redes sociais.

O caso Breendo expôs uma fratura antiga

O episódio envolvendo Breendo Teixeira, embora isolado, não é exceção. Comentários xenofóbicos contra paraenses em Manaus já foram registrados em diferentes momentos, e a internet apenas amplifica o que é dito fora dela. O pedido de desculpas do jornalista, embora necessário, não apaga o desconforto provocado.

Enquanto a Amazônia se torna cada vez mais estratégica para o futuro do planeta, os estados amazônicos precisam olhar menos para suas divisões históricas e mais para suas convergências, buscando uma integração que fortaleça a região frente aos desafios climáticos, sociais e econômicos que vêm pela frente.

Com Informações: Para Web News

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